Se alguém lhe
fizesse a seguinte pergunta: “Quando você
começou a escalar?”
Qual seria sua
resposta?
Muitos diriam cinco
anos, outros dez anos. Mas será mesmo? Talvez pelo
modo como a escalada seja vista, de forma profissional e esportiva sim,
entretanto se você recebesse a seguinte resposta:
- Comecei a escalar bem cedo, um pouco antes
de começar a caminhar, acho que com um ano de idade! – talvez nesse momento
você daria boas risadas, achando que se trata de uma piada ou pegadinha. Mas
vamos analisar de forma mais aberta e ampla essa afirmativa.
Todos nós
nascemos com uma habilidade natural para escalar, e podemos considerar aquele
nosso “bercinho” de infância como a primeira “grande montanha” de nossas vidas.
Impressiona ver um bebê de pouco mais de três meses, se agarrando nas paredes
do berço e tentando se puxar pra cima. Quem tem criança em casa ou na família,
sabe das inúmeras ocasiões que esses pequenos nos surpreendem, ao subir em
lugares que você jamais imaginava ser possível. Então ao invés de estimular
esse dom natural, procurando conduzi-lo com segurança, a maioria das pessoas
costuma dificultar esse processo, colocando barreiras que a fazem desistir, e
na maioria das vezes inibem completamente o acesso delas nesses locais.
Saindo da fase
de bebê, a partir dos dois anos de idade ninguém mais segura essas “feras”. É
só ver uma escada, uma árvore, uma pedra grande, um muro, ou qualquer outra
situação que seja possível “escalar” que lá estão eles, cheios de energia para
superar o obstáculo, demonstrando um grande orgulho quando conseguem atingir o
objetivo.
Ao longo da
vida vamos perdendo esse fascinante instinto, devido ao modo como as sociedades
vivem hoje, acreditando que essa atividade não se encaixa mais na vida moderna
que levamos.

Por Debora Hashiguchi
O corpo humano é um sistema
bastante complexo, vários órgãos e membros, abundantes articulações com
diferentes graus de liberdade e muitas combinações para tudo isso. Você já
parou para pensar como é que aprendemos a organizar e utilizar nosso corpo e
todos os recursos que ele oferece? Já se perguntou se o está fazendo da melhor
forma? Ou o que poderia fazer para envelhecer de forma mais saudável? Você foi
feito para escalar, subir é uma atividade natural do ser humano, praticada
desde o nascimento e, pelo menos, durante o desenvolvimento dos seus primeiros
anos de vida.
Os primeiros movimentos de um recém-nascido
são reflexos involuntários, fonte de informação sobre a saúde neuromotora, e
seu estímulo desencadeia o desenvolvimento dos movimentos voluntários. Ao
nascer, as mãos já são utilizadas para agarrar tudo o que tocam, nesta fase o recém-nascido
escala involuntariamente. Quando colocamos um brinquedo pendurado em cima de um
berço o bebê aprende a controlar os movimentos dos braços e das mãos, uma
ferramenta multifuncional do corpo humano, e a partir deste controle tudo o que
fazemos é escalar voluntariamente. O bebê aprende a se sentar utilizando as
mãos para se agarrar, puxar e empurrar “coisas”, coordenando os movimentos dos
braços e das mãos e fortalecendo a musculatura para sustentação do corpo na
posição vertical. Ao engatinhar aprende a coordenar os movimentos das pernas e
braços juntos, prática fundamental na escalada; para ficar em pé escala,
literalmente, as grades do berço e os móveis da casa. Toda criança, gosta de
escalar árvores e muros, nos parques gosta de brinquedos onde possa agarrar e
subir, agarrar e balançar, agarrar e deslizar, toda criança tem uma tendência
natural em agarrar e subir “coisas”, o desafio de subir “grandes” alturas é
visto como um convite para uma divertida brincadeira. Pode-se dizer que a
escalada faz parte do desenvolvimento humano, uma vez que utilizamos esta
técnica desde que nascemos.
Correr, saltar, chutar,
arremessar entre outras, o bom desenvolvimento destas habilidades são
totalmente dependentes do desenvolvimento do esquema corporal (comportamento do
corpo), consciência corporal (conhecimento do corpo) e controle corporal (uso
consciente do corpo) e a escalada, atividade mais básica e mais praticada pelo
ser humano nesta fase, trabalha todos estes aspectos e muito mais. Então, com
todos os benefícios da atividade, porque não continuar a escalar?
Quem observa uma criança se
divertindo em um parque infantil é testemunha de sua alegria ao escalar os
brinquedos. O que é tão divertido? O que é tão bom? Talvez hoje não seja tão
óbvio, mas estas são pequenas conquistas da autoestima na superação de limites,
é isso que nos faz feliz, saber que você pode e que você consegue. O ser humano
procura por superações por toda a vida, mas muitas vezes não sabe onde ou como
encontrá-las. Quanto maior sua habilidade na escalada, maior suas chances de
sucesso em outras tarefas e empreitadas, menor chance de decepções. A escalada
trabalha todas as capacidades físicas: resistência, força, velocidade,
agilidade, flexibilidade, equilíbrio e coordenação motora, mais que um esporte
é uma atividade física e como qualquer atividade física combate os maiores
vilões do século como o sedentarismo, depressão e doenças crônico
degenerativas.
Além do aspecto motor, a
capacidade cognitiva também é bastante exigida na escalada, você tem que se
concentrar no que vai fazer, lida com constantes desafios, está sempre
calculando a resolução de seus “problemas” e utiliza o raciocínio lógico para otimizar
sua movimentação, estes desafios cognitivos de concentração e memória
contribuem para a prevenção e minimiza efeitos de doenças degenerativas como o
Alzheimer.
Se todos estes benefícios ainda
não são motivos suficientes para você iniciar a prática da escalada podemos
ainda citar seus benefícios sociais: o controle da ansiedade é uma exigência
constante, a superação de seus limites, traz mais autoconfiança, portanto, mais
felicidade para o ser humano, você é um “superador” e um conquistador. Em um
ambiente de escaladores você encontra muitas tribos diferentes com diferentes
personalidades, mas nunca vai encontrar pessoas estressadas, mal humoradas,
deprimidas ou com qualquer aspecto negativo, o ambiente de escalada é alegre,
descontraído, as pessoas se apoiam, cooperam, se ajudam, torcem umas pelas
outras, convivem muito bem. Quando você está escalando está sempre na companhia
de alguém em quem tem que confiar e com quem tem que cooperar, muitas vezes
está em contato com a natureza aprendendo a conviver com ela, respeitando-a,
trabalhando a integração de mínimo impacto com outros e com ambientes naturais.
A escalada é um esporte completo:
físico, social e psicológico. Hoje em dia, infelizmente, os mitos e lendas
sobre os “perigos” da escalada faz muitos abandonarem esta prática já na fase
da adolescência e o desenvolvimento desta atividade regride e se estabiliza. O
ser humano se dá por satisfeito e não chega a se aproveitar dos maiores
benefícios deste desenvolvimento e nem ver a beleza do que está acima de sua
própria cabeça. Porque parar por aí? O desenvolvimento acaba sendo
subaproveitado e muitos dos seus benefícios não sendo alcançados. Nos dias de
hoje, onde as responsabilidades profissionais estão cada vez mais presentes nas
24hs da vida das pessoas, a escalada é atividade essencial para o
desenvolvimento de suas potencialidades.
Existem muitas modalidades
diferentes de escalada, qualquer pessoa, de qualquer cultura e com qualquer
classe social pode encontrar no universo da escalada uma que se encaixe no seu
perfil, que lhe proporcione maior prazer, que a faça mais forte, enfim que
desenvolva todas as suas potencialidades para uma vida mais autoconfiante, com
maiores conquistas, mais saudável. Como dizem os escaladores: “Kmon”, vamos
escalar, vamos ser felizes.
Debora Hashiguchi,
formada em Educação Física (1997), especialista em Treinamento Desportivo
(2006) e escaladora desde 2003.
Fonte: www.altamontanha.com
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